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Resenha: A Guerra Não Tem Rosto de Mulher, de Svetlana Aleksiévitch

a_guerra_nao_tem_rosto_de_mulh_1463281765584561sk1463281765bNome do Livro: A Guerra Não Tem Rosto de Mulher
Autor(a): Svetlana Aleksiévitch
Tradução: Cecília Rosas
Editora: Companhia das Letras
ISBN: 9788535927436
Ano: 2016
Páginas: 392
Avaliação:

5 estrelas
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A história das guerras costuma ser contada sob o ponto de vista masculino: soldados e generais, algozes e libertadores. Trata-se, porém, de um equívoco e de uma injustiça. Se em muitos conflitos as mulheres ficaram na retaguarda, em outros estiveram na linha de frente.

É esse capítulo de bravura feminina que Svetlana Aleksiévitch reconstrói neste livro absolutamente apaixonante e forte. Quase um milhão de mulheres lutaram no Exército Vermelho durante a Segunda Guerra Mundial, mas a sua história nunca foi contada. Svetlana Alexiévitch deixa que as vozes dessas mulheres ressoem de forma angustiante e arrebatadora, em memórias que evocam frio, fome, violência sexual e a sombra onipresente da morte.

“Guerra não é lugar de mulher” é o que se escuta nos filmes e o que se lê nos livros, mas a verdade é completamente diferente. Mesmo quem não participa ativamente da guerra, faz parte dela. Não dá pra escapar. Mas esse não é o caso da maioria das mulheres a quem Svetlana dá voz neste livro. Essas foram ativamente para a frente de batalha e lutaram lado a lado com os homens, mesmo que a história tenha esquecido delas.

“No exército soviético lutaram aproximadamente 1 milhão de mulheres. Elas dominavam todas as especialidades militares, inclusive as mais ‘masculinas’. Surgiu até um problema linguístico: as palavras ‘tanquista’, ‘soldado de infantaria’, ‘atirador de fuzil’, até aquela época, não tinham gênero feminino, porque mulheres nunca tinham feito esse trabalho. O feminino dessas palavras nasceu lá, na Guerra…” (pág 8)

Esse livro é composto de uma infinidade de relatos de todo tipo de mulheres sobreviventes da Segunda Guerra Mundial: as que lutaram nas linhas de frente, as que ficaram na retaguarda, as que fizeram parte dos partisans, as que atenderam os feridos, as que fizeram parte da resistência ou participaram de alguma forma da guerra onde foram mais de 20 milhões de soviéticos mortos. Existe sobre essa guerra uma infinidade de textos e livros, tanto históricos como de ficção, mas todos eles são relatos de homens que estiveram na guerra ou tem a visão masculina sobre o assunto. As mulheres foram silenciadas e conforme o leitor avança na leitura desse livro entende porque. Svetlana reúne as vozes dessas mulheres com relatos pessoais sobre as batalhas e suas impressões femininas, os preconceitos sofridos, violência, amor e ódio. É um livro tocante que deixa um sentimento de injustiça pairando após a leitura. As condecorações existiram, mas por que as mulheres não são vistas como heroínas dessa guerra onde participaram lado a lado com os homens que são considerados heróis?

A história contada nessas páginas é muito relevante. Tem detalhes e sentimentos que outros relatos não tem. O livro foi composto por uma série de entrevistas que a autora fez e gravou em fitas de áudio para poder estudá-las e não deixar que o tempo apagasse a emoção de cada relato. As mulheres queriam falar com a autora, contar suas histórias esquecidas e mesmo que fosse sofrido relembrar de tudo, entendiam a importância que era compartilhar o seu conhecimento e apresentar a sua própria visão dos fatos e o que lhes era importante. E ainda assim, tantos anos depois, muitas não conseguem relembrar ou não conseguem contar toda a verdade de algo que lhes acompanha pela vida.

Apesar do ódio, existiu muita solidariedade durante a guerra, mesmo para com os alemães invasores na União Soviética. Sabemos que nos últimos momentos da guerra não existia em muitos a vontade de matar e sim aquele sentimento de desperdício de vidas humanas e a vontade de viver para ver o fim dessa guerra. Nesse momento a ordem da parte soviética era a de tratar dos prisioneiros feridos, mesmo que fossem o inimigo. Depois de 4 anos de conflito, é bom saber que nem todas as pessoas perdem sua humanidade.

A capa do livro em vermelho combina com o que muitas das mulheres com quem a autora conversou afirmam: a de que a guerra tem a cor vermelha de sangue. Ela não é bonita e além de sangue tem sujeira, piolhos, e uma série de outras coisas desagradáveis até de se pensar. As páginas são em papel pólen, amareladas e a diagramação e o tamanho da fonte são práticos e confortáveis. A capa também combina com outras edições da Companhia das Letras, inclusive outro livro da autora.

Mesclando as sensações da própria autora enquanto escuta as veteranas de guerra com as de quem vivenciou esse momento histórico, o livro é uma revelação surpreendente sobre a força do ser humano, sua capacidade de adaptação as mais variáveis condições e sua fé em algo maior do que si mesmo. É surpreendente e emocionante. Vale a pena a leitura e recomendo que todos conheçam essa história que ficou por muito tempo escondida.

Franciely

É estudante de Letras por falta de melhor opção (já que não se pode ser somente estudante de literatura), leitora por prazer, amiga dos animais, viciada em internet e resenhista porque gosta de experimentar coisas novas.

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