Resenhas

Resenha: A filha de Ísis, de Margaret George

AS_MEMORIAS_DE_CLEOPATRA_1297009796BNome do Livro: A filha de Ísis
Nome Original: The memoirs of Cleopatra
Série: As memórias de Cleópatra
Autor(a): Margaret George
Tradução: Lidia Cavalcante-Luther e Cassia Zanon
Editora: Geração editorial
ISBN: 9788586028878
Ano: 2011
Páginas: 485
Nota: 4/5
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A Filha de Ísis – O romance histórico reconstitui o Egito antigo e o Império Romano. As memórias de Cleópatra são narradas por ela mesma. Conhecemos sua infância, sua trajetória rumo ao poder e todo o esplendor da Alexandria e Roma antiga.

 

 

A bela história de amor e guerra entre a rainha Cleópatra e os romanos é um dos pilares da história mundial. Margaret George começa com A filha de Ísis a imensa tarefa de recriar o Egito em um conturbado período em que quase todo o mundo conhecido havia sido conquistado por Roma.

O Egito em que Cleópatra nasceu estava muito enfraquecido internamente quando comparado à grandiosidade dos faraós. Descendente de Alexandre, o Grande, o clã dos Ptolomeus governava o Egito há trezentos anos. Sendo uma linhagem grega ligada tenuemente aos legítimos faraós, os Ptolomeus adotaram a religião e os costumes dos egípcios, entre eles o casamento entre irmãos, para reinar com certa legitimidade, mas muitos sequer falavam o idioma egípcio. Já na época, em torno de 69 a.C., as pirâmides eram relíquias de um passado distante (para se ter ideia: a construção das pirâmides é estimada em 2500 anos antes do tempo de Cleópatra, enquanto ela nasceu a apenas pouco mais de 2000 anos antes de nós). Alexandria, a cidade fundada por Alexandre, o Grande, era uma capital de efervescência cultural e científica, conhecida em todo o mundo por ser maior e melhor em diversas áreas, com o suprimento de alimentos e riquezas que vinham com a cheia do Nilo. Seu imenso farol, um dos símbolos da cidade, guiava os navios comerciantes. A biblioteca de Alexandria continha milhares de papiros, era a maior do mundo e atraía estudiosos de todas as nações.

Narrado em primeira pessoa, revelando todas as inseguranças e desejos da personagem, Margaret George retrata Cleópatra como imaginamos a mulher histórica: complexa, muito a frente de seu tempo, fluente em diversas línguas, acima de tudo corajosa e devotada aos seus deveres.

 

“-Vejo que você é melhor rainha do que amante.” (página 463)

 

Ao subir ao trono como rainha, Cleópatra imediatamente é impedida por uma guerra civil contra os partidários de seu irmão, Ptolomeu XIII, com quem ela deveria se casar. O rumo dessa guerra muda com o aparecimento do general Pompeu nas praias alexandrinas, onde ele buscava refúgio das legiões de Júlio César. Quando César chega a Alexandria, Ptolomeu o presenteia com a cabeça de Pompeu. César chora o assassinato de seu rival e amigo, se instala no palácio real e aguarda o desenvolvimento do conflito. Cleópatra então consegue entrar nos aposentos de César escondida dentro de um tapete – cena que ficou famosa e já foi reproduzida de diversas maneiras no teatro e na TV. Os dois tornam-se amantes e essa aliança muda o rumo da história de Roma. César lidera a campanha para acabar com os partidários de Ptolomeu XIII e, resolvida a questão, demora-se mais alguns meses no Egito para partilhar a companhia de Cleópatra. Juntos, eles vão visitar as pirâmides e as margens do Nilo. É o período de maior felicidade para eles, quando conseguem ficar mais tempo juntos e formam o elo que durará até o fim de suas vidas.

Para referências mais visuais e uma ampla compreensão do contexto da época recomendo Roma, uma série de TV da emissora HBO (a mesma de “Game of thrones”) que mostra diversos eventos que são imediatamente anteriores aos narrados neste primeiro volume. Cleópatra aparece no oitavo episódio, mas é completamente diferente da personagem mostrada no livro – na série ela é uma mulher promíscua, viciada em ópio e manipuladora (talvez esta última característica não seja tão diferente…). Os mais importantes personagens romanos do livro também aparecem na série, o que facilita a compreensão das facções que traíram Júlio César. Apesar de diferente em diversas interpretações do caráter dos personagens, o resultado final de suas ações é o mesmo. Assistir a essa série pode dar uma nova perspectiva das intenções de cada personagem, como suas ações podem ser as mesmas por diferentes motivos.

Algumas palavras são usadas ao longo do livro de maneira diferente do que as conhecemos atualmente: “Ditador” era um cargo temporário concedido pelo prazo de seis meses em tempos de guerra para que Roma fosse governada mais rapidamente, sem a necessidade das amplas discussões do senado, era uma atribuição essencial para a sobrevivência da república. Havia ainda as comemorações do libertus, onde os participantes eram chamados de libertinus, nessa semana os escravos tinham permissão para apostar e muitos dos romanos de origem nobre vestiam-se de escravos e os cidadãos fantasiavam-se de nobres. Era permitida qualquer descortesia sem ressentimentos, uma época de permissividade que justifica o uso contemporâneo da palavra.

Em A filha de Ísis o Egito é muito mais do que um país desértico famoso por suas pirâmides. Ele é pintado com as mais diversas cores, rico em música, cultura e sabores, experimentados um a um por sua rainha. O problema constante do choque cultural entre romanos e egípcios é quase cômico, quando ambos se acusam de bárbaros, é muito compreensível a dificuldade mútua de compreender os hábitos primitivos. Eventualmente, são essas diferenças que mais atrapalham a união de Cleópatra e César.

Ao recriar uma das mulheres mais conhecidas da história, Margaret George certamente teve que fazer várias escolhas para justificar os rumos da narrativa. Uma das mais importantes foi supor que Cleópatra e Júlio César de fato se apaixonaram, que a firme aliança que formavam não foi parte de uma simples estratégia de estado. Isso torna a leitura mais agradável e fluente para o romance épico que está sendo construído.

A edição em três volumes lançada pela Geração editorial está caprichada, os livros são de bom tamanho, com fonte grande e leitura agradável. Mesmo que tenha muitas páginas a lombada não ficou marcada; sendo cuidadoso na leitura, quando terminei o livro ainda parecia novo! Não encontrei erros de digitação, o que sempre é um bônus. A box em que vem os três livros é de boa qualidade e, diferente de muitas que tenho, depois de lidos você realmente consegue colocar os livros de volta na caixa!

De brinde: tente encontrar no livro os poetas Horácio e Virgílio (conhecido por seu poema épico Eneida).

Por que ler este romance biográfico sobre Cleópatra e não um dos quinhentos outros que encontramos aos montes em qualquer livraria? Porque a autora não deixa a história virar um melodrama, torna-o tão real quanto a literatura permite e interpreta os fatos históricos de maneira acessível ao leitor sem deixar de lado a profundidade dos dilemas que levaram ao trágico desfecho de uma das mais belas histórias de amor da antiguidade.

Jairo Canova

Jairo Canova é Administrador e gosta de livros mais do que imagina.

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