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Lovecraft Country | Crítica

Quando “Lovecraft Country” foi anunciado, talvez o detalhe que mais chamou a atenção foi o envolvimento de Jordan Peele na produção da série. O diretor de “Corra!” e “Nós”, conhecido sobretudo por sua postura antirracista em seus filmes de terror produziria uma série que trazia no título o nome Lovecraft. Este é um escritor conhecido, na mesma medida, pela sua influência no gênero e por suas posições supremacistas e fascistas.

Assim a adaptação do livro homônimo de Matt Ruff, a série, se mostrou talvez o produto audiovisual mais bem acabado do ano. Esta se tornou uma peça narrativa essencial para nossos tempos.

Lovecraft e o racismo

Primeiramente vamos ao título do projeto, o acerto do livro e da série. “Lovecraft Country” é o país que o autor concebia. Suas obras, tanto as literárias como suas correspondências com outros artistas da época demonstram muito bem o que era seu mundo interior. Principalmente o que reservava para imigrantes e especialmente negros. O país de Lovecraft é um lugar hostil devido ao seu panteão de criaturas inomináveis, mas também pela aversão a outros seres humanos.

E nisso a série pisa fundo, em especial pelo trabalho de Misha Green, consequentemente a mais reconhecida roteirista da série. Em muitos momentos, seu texto é um tipo de descarga ou desabafo. Principalmente porque a autora alega que pessoas brancas não podem chegar perto de entender o efeito do racismo. Mas apenas por um grande esforço empático, compreender.

george courtney b vance letitia jurnee smollett e atticus jonathan majors em cena de lovecraft country

Território Lovecraft, Maus e as guerras

Na trama, acompanhamos Atticus. Ao voltar para sua cidade, após a Guerra da Coreia, ele se vê envolto numa perseguição. Essa se dá por parte de um grupo ocultista que busca a vida eterna. Assim sendo o protagonista descobre sua essência episódio a episódio, numa escalada em que carrega seus entes queridos. Aqui devo destacar a personagem Leticia, um interesse romântico da juventude que encontra seu próprio caminho ao ser arrastada para esse turbilhão de loucura. Apesar de não citar outros personagens, para evitar revelações do enredo, cabe dizer que todo o corpo de coadjuvantes tem seu espaço para crescer. Todo o universo parece construído de maneira intensa e detalhada.

Por exemplo, vejamos o caso do personagem de Michael K. Willians, com um arco que coloca tons de cinza na realidade. Com a finalidade de revelar como as relações de opressão vão e vem em muitas direções, seu arco mostra como outras minorias são vistas sem jamais perder o foco que é o racismo. O mesmo acontece num breve momento onde a Guerra da Coreia é visitada.

Esses momentos me fizeram lembrar de um trecho de “Maus”, quadrinho de Art Spielgeman. Nesta HQ podemos ver sobreviventes do holocausto tendo posições racistas contra negros nos EUA. Para encarnar essa profundidade, todo o elenco brilha, sendo assim difícil encontrar pontos negativos na atuação ao observar a peça completa. Seja na fúria contida sempre presente no elenco masculino ou no movimento central da trama realizado pelo elenco feminino. Talvez a única falha seja o caminho tortuoso da vilã, Christina (Abbey Lee Kershaw), pois sua construção oscila e isso se reflete em tela.

topsy bopsy lovecraft country

Altos e baixos de uma série excelente

Com pouco pontos baixos a série afinal tem uma estrutura coesa em que brilham referências históricas e de erudição. Um dos pontos baixos é, infelizmente, o episódio final que tenta fechar muito mais pontas do que poderia.

A boa colocação dos poemas “Cacht on Fire” de Sonia Sanchez e “Whitey on the Moon” de Gil Scott-Heron, que funcionam tanto como comentadores das cenas quanto como manifestos para os espectadores. Como resultado eleva a força da mensagem já bem clara da série. Mostrando que seja qual for o critério que usemos, “Lovecraft Country” é uma obra de arte.

A série se encontra disponível no site oficial da HBO Go.

Ficha Técnica

Lovecraft Country
Canal: HBO
Episódios: 10
Direção: Misha Green, Jordan Peele
Roteiro: Misha Green
Elenco: Jurnee Smollett-Bell, Jonathan Majors, Michael Kenneth Williams.

11 thoughts on “Lovecraft Country | Crítica

  • Não conhecia essa série, mas achei bem interessante, sabendo que é o mesmo diretor de ‘Corra!’. Eu fiquei impressionada com aquele filme e com medo real. É uma pena que não tenho como ver HBO Go, mas já fica anotada a dica, para quando puder conferir.
    Bjks!

    Mundinho da Hanna
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  • Ai já quero assisti, não sabia que era tão boa assim. Anotadinho aqui. Obrigada pela sua indicação, bom domingo.

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  • a série é de terror? porque essa imagem da criança ficou bem assustadora e eu sou cagona então pra assistir algo de terror preciso de companhia kkkk.

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    • Rafael Assis

      A série tem criaturas e assombrações bem pesadas graficamente, mas não pesa a mão no gore. Assustadoras mesmo são as relações de raça que a série mostra.

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  • Puxa, fiquei super empolgada com a possibilidade de assistir à adaptação, porém me entristeci quando vi estar na HBO. Que lástima!
    Uma super proposta!

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  • Menina, que série, hein… gostei da resenha, da proposta, pena que não é na Netflix para que eu possa acompanhar. Fiquei curiosa também com os poemas que são mencionados.

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  • Incrível que por todas essas razões apresentadas inicialmente, esta se tornou uma peça narrativa essencial para nossos tempos, como você mencionou! Confesso que eu nunca assisti algo do tipo. Fiquei intrigada!

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  • Eu adorei suas considerações, principalmente sobre o final, porque o maior problema das séries é fechar mais do que suporta por abrir muitos plots. Eu quero muito assistir, mas quero ler o livro primeiro, ele foi publicado pela Intrínseca, se não me engano.

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    • To querendo muito assistir. Ainda mais por ser fã da obra de lovecraft, embora reconheça esse defeito terrível no escritor.
      Quero ler o livro antes da série. Se fosse Netflix seria ótimo, não tenho HBO, então vai esperar um pouco pra que eu assista.

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  • Erika

    Oi, tudo bem? Cheguei a assistir o trailer mas ainda não dei chance para o primeiro episódio. Pela sua resenha dá para perceber que a produção tem muito o que agregar. Interessante suas considerações. Um abraço, Érika =^.^=

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  • Oioi! Gente, não estava sabendo dessa série. Eu adorei Nós e Corra!, então suponho que também vá gostar dessa produção. Não conheço a obra de Lovecraft a fundo, mas sei dessa questão do racismo e suas posições um tanto problemáticas, então imagino que a série seja bastante indigesta em alguns pontos (como costumam ser as obras que tem Peele no meio). Vou conferir. Abs!

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